segunda-feira, 4 de setembro de 2006

'Revolução cultural' a chicotadas!

Instituição particular chinesa criada para disciplinar meninos faz sucesso castigando mau comportamento!

Indagados sobre se alguém já tinha levado uma surra do professor, todos os alunos apontaram para Chen Chen. O menino, de 12 anos, levantou a camiseta. O suficiente para se ver quatro marcas indistintas de um chicote nas suas costas. "Claro que doeu", admitiu. "Mas foi porque eu me comportei mal".

"Nós ficamos todos morrendo de medo", replicou seu colega Xia Mingying.

Se você acha que essas crianças são vítimas de alguma escola pública de baixa categoria, está enganado. Os pais delas pagam muito bem para enviá-las a West Point, um acampamento que recebe o nome da famosa academia militar dos EUA, mas se destina a corrigir os "pequenos imperadores" da geração chinesa de filhos únicos. Durante mais de duas décadas, a rígida política chinesa de planejamento familiar criou uma cultura na qual o tão desejado único herdeiro masculino tende a ser um menino completamente sem controle, tanto em casa como na escola, já que os pais obcecados esquecem de ensinar-lhe o significado da disciplina.

Uma mulher acredita que o único meio de controlar todos esses meninos mimados é usar o castigo. No acampamento West Point de Wan Guoyin, toda criança conhece as conseqüências de seu mau comportamento. Quem comete infrações mais graves recebe uma chicotada sem a camiseta, mesmo no inverno mais rigoroso, e diante de toda a escola. No caso de delitos menores, como praguejar, os alunos podem ser obrigados a engolir uma concha de molho de pimenta ou mastigar uma erva chinesa amarga que deixa a língua amarela durante horas.

"Vi um garoto cuspir e e vomitar essa erva", disse Zheng Dongxim, de 12 anos. "A professora obrigou-o a comer duas vezes mais."

"Fazemos isso mais pela humilhação do que pelo sofrimento", diz Wan, de 47 anos. "O objetivo é dar-lhes uma lição memorável." Wan teve a idéia há cinco anos, quando participou de um programa de rádio sobre crianças-problema. Ex-professora de um jardim de infância e mãe de uma jovem de 22 anos de idade, ela lembra que quase 90% das pessoas que se manifestaram durante o programa se queixavam de problemas de disciplina com seus filhos.

Há alguns anos, Wan iniciou um pequeno programa para horários após a escola para ver se podia ajudar. Os pais apreciaram tanto a idéia que o programa, que contava inicialmente com uma dezena de crianças, hoje tem 100 alunos nos acampamentos de verão em tempo integral, e outros 100 em lista de espera.

Os meninos passam o verão em um acampamento alugado por um instituto de língua estrangeira na periferia da cidade de Hangzhou. Eles permanecem ali num programa de dois meses, vivendo em dormitórios onde todos se levantam às 6 horas e passam o dia estudando em classes abafadas ou treinando ao ar livre no calor. Têm algum tempo livre para brincar, mas nada de TV.

"Meu filho melhorou tanto que seu professor diz que ele é outro", diz Yang Yang, mãe de Ling Ling, de 12 anos, que tinha problemas de comportamento desde o primeiro dia na escola.

A maioria das crianças chinesas ainda vive no interior e muitas são de famílias tão pobres que não podem nem mesmo desfrutar de uma educação básica, muito menos pagar por atividades extracurriculares caras. Mas, em mais um sinal de que a brecha entre ricos e pobres está aumentando, escolas alternativas de linha dura floresceram por todo o país para atender à demanda crescente de muitos pais em áreas urbanas frustrados com os modos rebeldes de seus filhos supermimados.

"Como são filhos únicos, os pais dão a eles tudo o que querem e ficam sem nada para eles próprios", disse Wan, que cobra US$ 300 por mês por seu programa. "E as crianças ainda dizem que são infelizes e se comportam mal. É porque não sabem o que é felicidade. Aqui oferecemos amargura, assim elas têm um ponto de referência."

No início, as chicotadas não faziam parte da rotina diária. Uma ocasião, um estudante acidentalmente derramou um pouco de sopa num colega. Este, com a camiseta suja, reagiu e derramou uma bacia com um líquido quente no colo do primeiro. Wan estava perto dali e, sem pensar muito, chicoteou a mão do menino com uma corda de plástico. "Até eu fiquei chocada com o que fiz", diz ela. "Todos os alunos ficaram paralisados." Cheia de remorso, Wan entrou imediatamente em contato com os pais do aluno e se desculpou. Para sua surpresa, a mãe lhe respondeu que ela "deveria ter feito isso há muito tempo".

Gradativamente, Wan começou a introduzir o chicote no seu repertório e ele se tornou a marca registrada de sua academia. "Alguns pais batem nos filhos também, mas com freqüência o fazem aleatoriamente e as crianças nem sempre entendem a causa e o efeito, de forma que sofrem por nada", diz, insistindo que é cuidadosa em seus castigos. "Aqui nunca fazemos alguém sangrar. Eu apenas atinjo as costas e só a pele, não o osso. Assim o castigo parece ruim, mas cura rápido."

Semanalmente, uma dezena de meninos é retirada da sala de aula e levada para se submeter a uma punição especial e uma chicotada pública obrigatória.

Eles são submetidos a várias horas mais de treinamento físico no calor estafante do verão e devem arrancar as ervas daninhas e limpar o acampamento. E só lhes é permitido comer arroz no almoço, enquanto os outros meninos podem comer carne e outros acompanhamentos.

"Depois de três dias de punição severa como essa, eles percebem que voltar para a sala de aula e fazer os trabalhos de casa é muito melhor", diz Wan.

Se, de um lado, ela tem mão de ferro, de outro tem um coração mole. Sua sala no acampamento está repleta de brinquedos e lanchinhos que ela distribui ao menor sinal de bom comportamento, como dizer "obrigado" ou mesmo contar a verdade. Ela chega até a dar dinheiro, que os alunos podem guardar e levar depois para os pais - e nesse processo aprender o valor do dinheiro.

"Eu ganhei um miniventilador elétrico, algum dinheiro e carne seca", afirmou Li Junjie, de 12 anos, um viciado em computador que detestava vir ao acampamento. Agora, diz que adora. "Não tenho medo da professora Wan. Se somos castigados é porque nós próprios provocamos."


Frases

Chen Chen
Estudante de 12 anos

"Claro que doeu. Mas foi porque eu me comportei mal"
(sobre as chicotadas que levou do professor em suas costas)

Zheng Dongxim
Estudante de 12 anos

"Vi um garoto cuspir e vomitar essa erva (amarga que deixa a língua amarela por horas). A professora o obrigou a comer duas vezes mais"


Wan Guoyin
Criadora do acampamento West Point

"Como são filhos únicos, os pais dão a eles tudo que querem. E as crianças ainda dizem que são infelizes e se portam mal. É porque não sabem o que é felicidade. Aqui oferecemos amargura e assim elas têm uma referência"
"Nunca fazemos alguém sangrar. Eu atinjo apenas as costas e só a pele, não o osso. Assim o castigo parece ruim, mas cura rápido"
"Após 3 dias de punição severa, eles percebem que voltar para a sala de aula e fazer os trabalhos de casa é muito melhor"

Ching-Ching Ni, Los Angeles Times
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