Bangu inventa o futebol de aluguel
Madureira empresta todo time ao Bangu para agradar ao presidente da federação
Bruno Lousada
Clube que revelou craques como Domingos e Ademir da Guia, o Bangu perdeu a identidade e a força no futebol do Rio de Janeiro. Sem recursos, disputa a seletiva para o Campeonato Carioca de 2007 com um time de aluguel, fruto de acordo de bastidores. O presidente do Madureira, Elias Duba, emprestou todo o elenco e a comissão técnica da equipe vice-campeã estadual deste ano para o Bangu, cujo presidente de honra, Rubens Lopes, ocupa a presidência da Federação de Futebol do Rio, desde a morte de Eduardo Viana, o Caixa d'Água, em agosto.
O Madureira só volta a participar de competições em janeiro e, além de ter cedido seu estádio para a preparação do Bangu, continua pagando os salários de seus representantes. A ajuda, no entanto, tem prazo de validade: termina no fim do torneio, que oferece quatro vagas à Primeira Divisão do Carioca.
A paixão pelo clube de coração, porém, não é de aluguel. Sentado numa cadeira de rodas, o aposentado João Batista, de 91 anos, não costuma perder nenhuma partida do Bangu. Ele foi ontem à tarde ao Estádio de Moça Bonita com seu motorista particular, para assistir ao empolgante duelo contra o Mesquita - e saiu satisfeito com a vitória do Alvi-Rubro, por 1 a 0.
Conhecido por todos no local, Batista guia sua cadeira de rodas até o gramado e se coloca perto do banco de reservas com um binóculo. Falar sobre a história do Bangu é o seu maior prazer. Mas ele se inquieta quando trata da parceria. 'Fico triste com isso. O Bangu tinha que revelar seus próprios craques, como fazia antigamente.'
Cercado por amigos, na arquibancada, o banguense Zé Carlos, de 62 anos, também discorda do empréstimo. 'Agora torço para o Bandureira Futebol Clube.'
Andarilho do futebol, o zagueiro Odvan, que já defendeu a seleção brasileira e tem contrato com o Madureira, nunca imaginou atuar no Bangu. 'Nem conheço a letra do hino. Vou acessar a internet para escutá-lo', afirmou, constrangido.
Enquanto acompanhava o jogo da tribuna de Moça Bonita, Rubens Lopes não gostou de ser indagado sobre a parceria Bangu-Madureira. 'Eu não tenho que achar nada. Quem tem que achar alguma coisa é o presidente do Madureira', retrucou, irritado. De acordo com a advogada Vera Otero, especialista em direito esportivo, não há nada na legislação que impeça o acordo dos clubes.